terça-feira, 22 de maio de 2012

Entrevista do "Tertúlias à Lareira" a Ricardo Tomaz Alves, autor de "A Devota"


À Lareira Com... Ricardo Tomaz Alves

Fala-nos um pouco sobre ti, como pessoa, jovem e músico.

Acredito que uma pessoa possa levar uma vida inteira sem se compreender totalmente, sem conhecer todas as suas qualidades e defeitos, forças e fraquezas e, parecendo esta limitação humana um pouco triste é um factor que nos dá graça e torna imprevisíveis. Posso, no entanto, partilhar o pouco que sei sobre a minha pessoa. Sou calmo, caseiro, cinéfilo e extremamente pensativo (o que pode, por vezes, levar-me à soturnidade e melancolia). Extremamente sonhador, bem podia ter um quarto nas nuvens só para mim. Adoro tocar e criar música e considero-me criativo por natureza. Enfim, um rapaz com qualidades e defeitos, como qualquer outro, à procura de si.

Escreveste o teu primeiro livro aos 12 anos. Sobre o que escreveste, na altura?

A história era baseada num videojogo que joguei na altura, o “Heart of Darkness” para a Playstation (passo a publicidade). O que fiz foi escrever a história do jogo e de alguma forma complementá-la com a minha imaginação. Lembro-me que deu bastante trabalho porque como não tinha computador escrevi à mão cerca de quarenta páginas. A minha professora de Inglês da altura pediu-me o manuscrito para ler e perdeu-o. Fiquei aborrecido e com pouca vontade de escrever tudo de novo, além de não ser algo a que me quisesse entregar na altura, deixando a escrita de lado.


Antes desse livro, já sentias o gosto pela escrita?

Lembro-me de no meu 5º ano de escolaridade a Professora de Língua Portuguesa mandar como trabalho de casa semanal a escrita de um texto criativo, que seria posteriormente lido para os colegas e de estes, aquando da minha primeira leitura, terem gostado bastante da história que ouviram. A partir daí, em vez de se disponibilizarem para ler os seus textos sempre que a Professora pedia um voluntário, preferiam escolher-me a mim para ler o que escrevera, para ouvirem. Desde então que percebi que talvez tivesse algum jeito para a escrita e sempre que me perguntavam o que queria ser respondia “escritor”. O gosto pela escrita era então uma realidade.

Qual a memória mais antiga que tens que envolva a leitura? E a escrita?

Tornei-me um leitor compulsivo com os livros juvenis de suspense e terror “Arrepios” que li e coleccionei durante a minha adolescência, pelo que posso considerar R.L. Stine a minha maior influência enquanto escritor, pela vontade que me deu de escrever e fazer algo do género. Quanto à memória mais antiga que envolva a escrita terei de dizer os tais textos das aulas de Língua Portuguesa do 5º ano.

Só voltaste a escrever aos 18 anos. Porquê uma paragem de 6 anos?

Tendo a minha professora de Inglês perdido o meu primeiro manuscrito, fiquei aborrecido e com pouca vontade de escrever tudo de novo, além de não ser algo a que me quisesse entregar na altura, por ter tantas outras distracções normais e próprias da adolescência. Era muito novo para me dedicar à escrita.

Escreveste "Rio Equilibrium – 1º volume". O que nos podes dizer sobre ele?

Posso dizer que é um romance fantástico sobre um híbrido de anjo e demónio que é esculpido numa Pedra Sagrada e trazido à vida com o intuito de restabelecer o equilíbrio da Terra.

Depois escreveste uma biografia. Agrada-te diversificares o teu género literário?

Não pretendo ser um escritor de estilo único porque acabaria por oferecer sempre mais do mesmo ao leitor, mas antes do género multifacetado, explorando vários estilos e abordar várias técnicas, evitando a repetição e previsibilidade. Escrevi um romance fantástico, uma auto-biografia, um romance, um livro de contos e um ensaio, tendo regressado recentemente ao género romancista.

Recentemente publicaste “A Devota”. Como surgiu a inspiração e a ideia para este livro?

Sendo Portugal um país maioritariamente católico, não tendo a minha família fugido à regra, sempre ouvi, desde pequeno, que Deus vê e ouve tudo e que está sempre connosco, o que me levou a perguntar-me se estará presente nos nossos momentos mais íntimos e a que ponto será essa omnipotência e presença invasão e violação de privacidade, surgindo então a ideia de escrever uma história que abordasse este tema dramática e comicamente. “A Devota” conta uma história passada nos subúrbios e vila de Sintra, em locais secretos que desafiam a imaginação e que retratam a luta interior de uma jovem que terá de ultrapassar as difíceis fases da infância e adolescência enquanto enfrenta a luta interior de acreditar ou não no que lhe é dito e ensinado, enfrentando vários desafios à sua fé e psique.

Tens algum projecto, na literatura, em mãos neste momento? Se sim, o que podes revelar para nos aguçar a curiosidade? 

Estou neste momento a escrever um novo romance que retrata a vida de um jovem desempregado que para além de comparecer às mais estranhas e mirabolantes entrevistas de trabalho experiencia novas sensações e conhece novas pessoas, entre elas duas mulheres que vão dividir e confundir-lhe o coração.

Numa palavra, o que a escrita significa para ti?

Sonho.

Também és músico e compositor. Mais uma vez, a escrita faz parte da tua vida. Como conjugas todos estes “amores”? (A vida pessoal, a musica, a escrita…)

Como a minha mãe sempre disse: “Há tempo para tudo, se o dividirmos bem” e, até agora, tem-se provado ser verdade. Tenho um horário laboral das 10h às 19h, ensaios com a minha banda às segundas e quartas e concertos num ou outro fim-de-semana. Para escrever, não tenho horários. Normalmente preciso de um dia inteiro livre para fazê-lo, porque é um processo que requer concentração, solidão e inspiração e em doze horas sou capaz de escrever quatro páginas ou nem isso. Às vezes tento obrigar-me, mas de pouco vale. Tenho mesmo de estar para aí virado e ainda bem que assim é. Na minha opinião forçar a escrita é um erro, pois acabamos por escrever coisas que não queremos e sem interesse que servem apenas para ocupar espaço e substituir texto que poderia ser de melhor qualidade. Se me sento em frente ao monitor e não me sai nada, prefiro escrever noutra altura do que estar a inventar algo sem nexo.

Como gostarias de “te ver” daqui a dez anos?

Nobel, com dois grammys e uma palma de ouro. 

No 5º ano, quando te perguntavam dizias que querias ser escritor. Hoje em dia, vês-te como tal? 

Vejo. Pelo que já escrevi e continuo a escrever posso considerar-me como tal. Não vivo da escrita e será muito difícil tal ser possível mas é uma constante na minha vida e espero que continue a ser por muitos anos.

Para terminar, o que gostarias de dizer aos nossos leitores, amantes de livros, apaixonados por uma boa leitura?

Que continuem a ler, procurando sempre mais e melhor na literatura e que dêem uma oportunidade aos escritores portugueses, aos quais não falta talento e dedicação. Leiam livros contemporâneos mas também os clássicos e variem os géneros, porque “tudo vale a pena se a alma não é pequena”.

Obrigada, Ricardo Tomaz Alves

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